O problema dos Millennials

11.12.17

Imagem por Stocksnap, sob licença Creative Commons.

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Nos disseram que éramos o futuro, a esperança de um mundo melhor. Colocaram, sobre os nossos ombros, o peso de curar um mundo quando nem sabemos o efeito que podemos ter sobre ele. O grande problema é que o futuro parece estar tão distante de nós e ao mesmo tempo passa em um piscar de olhos.

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Há um tempo atrás fiquei familiarizada com o termo Millennials, mesmo eu sendo uma, não fazia a menor ideia de que nos chamavam assim. A primeira vez que escutei essa palavra, em conversas aleatórias de outras pessoas, pensei que era algum tipo de fandom ou algo relacionado a desenhos, tipo Royals e Rebels. Sim... foi a primeira coisa que eu pensei, não me julguem.

Caso você não saiba, Millennials são aquelas pessoas que nasceram entre os anos oitenta e dois mil, também conhecidos como a geração Y (cada site diz uma coisa em relação ao ano, já que não há  um marco tão exato que separe gerações). Além disso, os Millennials são divididos em dois grupos os Young Millennials (tiveram sua adolescência nos anos 2000) e os Old Millenials (tiveram sua adolescência nos anos 90).

E o que significa ser um Millennial?

Isso significa que desde pequenos já estávamos em contato com a tecnologia, seja a partir da nossa infância ou adolescência, e por causa disso, pensamos e agimos diferente da geração anterior. Alguns dizem que temos o pensamento mais acelerado, que queremos tudo para hoje e que a facilidade que temos de encontrar tudo a um click resulta nisso. Dizem que somos mais conscientes em relação aos problemas ambientais, lutamos contra o preconceito e prezamos por boas experiências de vida.

Nascemos em uma época de mudanças drásticas, onde no fundo de nossas memórias ainda conseguimos nos lembrar das fitas cassetes, disquetes e celulares que abriam e fechavam (olá V3 rosa que eu sempre quis), talvez alguns de nós nem se lembrem mais de como era divertido rebobinar as fitas do Rei Leão.

Fomos criados de uma forma diferente dos nossos pais, assim como eles foram criados de forma diferente em relação aos nossos avós. Eles prezaram pela nossa educação, já que muitos deles não haviam feito uma universidade e sabiam que para ter sucesso era necessário ter um diploma em mãos. Nos presentearam com brinquedos e eletrônicos, nos levaram para passear em lugares seguros (na rua nem pensar!), nos deram oportunidade para exercitar nossa criatividade e habilidades com aulas extras: inglês, espanhol, dança, judô e qualquer coisa que aumentasse nossas qualidades futuras para o mercado de trabalho.

E é aí que mora o problema.

Nossos pais trataram de criar o nosso currículo desde o momento em que nascemos, estavam sempre preocupados com o nosso futuro, com a nossa escolha para a faculdade, já que eles conhecem o peso da realidade na própria pele, sabem que não é fácil conseguir um emprego e que o mercado de trabalho é regido pela lei da selva.

Somos cobrados por nossos pais e por nós mesmos, temos que ser bons em tudo e sempre buscamos mais para ter um futuro de sucesso, mas muitas vezes, nem sabemos o que isso significa. Estamos absorvendo essa cobrança e esse “ser melhor que o outro” a partir do momento em que abrimos os olhos e nossos pais começam a nos comparar com outras crianças:

“Meu filho falou a primeira palavra antes de completar um ano e o seu ainda não? Deve ser algum problema”.
“Nossa, seu filho ainda não começou a engatinhar? O meu já anda”.
“Não saiu das fraldas? O meu já”.
“Usa chupeta? O meu nunca chegou perto, isso estraga os dentes”.
“Ainda não aprendeu a ler? O meu já sabe escrever”.

Crescemos nesse ambiente competitivo onde nos comparam constantemente com outras crianças, como se não entendessem que somos diferentes e temos capacidades diferentes, e muitas vezes, nós também não somos capazes de enxergar isso. Nos exigem as melhores notas e isso nos leva, desde pequenos, a um sentimento de fracasso, de não ser bom o suficiente ou inteligente o suficiente.

Esquecemos de aperfeiçoar nossas habilidades sociais, nos tornamos individualistas, sempre pensando no nosso melhor e, se seguirmos o plano de vida estruturado pela sociedade, seremos bem-sucedidos.

Se sou bom na escola entrarei em uma boa faculdade.
Se entro em uma boa faculdade conseguirei um bom emprego.
Se consigo um bom emprego terei muito dinheiro.
Se tenho dinheiro tenho sucesso.

Vivemos nessa bolha de sucesso e fracasso, e muitas vezes não trabalhamos naquilo que realmente vamos precisar no futuro.

O que adianta saber cinco línguas e tratar os outros como lixo?
O que adianta ser o melhor matemático se não é capaz de ouvir a opinião dos outros?
O que adianta saber a tabela periódica de cabeça se você não sabe nem fritar um ovo?

Saímos do ensino médio cansados de ouvir opiniões sobre a nossa própria vida. Entramos em uma crise existencial de não saber quem somos, o que queremos e como conseguiremos isso. Queremos que sintam orgulho de nós, por mais rebeldes que possamos parecer, pensamos duas vezes antes de escolher nossas profissões, porque desejamos ter essa vida de sucesso que tanto nossos pais nos contaram.

Pensamos se todo esse esforço que fizemos até aqui realmente valeu à pena, se ser o melhor todo esse tempo, vai fazer com que tenhamos um lugar na faculdade mais renomada de onde vivemos. Muitas vezes ouvimos o sonho dos nossos pais, os dizeres “não te paguei anos de escola para você ser tal coisa”, e escutar isso nos machuca, como se não fôssemos capazes de fazer boas escolhas. Cobram para que sejamos gênios em algo que nem temos certeza, querem que entremos em faculdades públicas a qualquer custo sem nem se importar se é isso o que queremos.

Escutamos frases do tipo “enquanto você está saindo para festas, há outra pessoa estudando e é ela que vai roubar o seu lugar na faculdade”. Passamos noites em claro memorizando, alguns chegam a tomar remédios de concentração, nos afastamos de tudo para focar em ter um nome em uma lista, nome esse que pode “garantir nosso futuro”.

Então começamos com as crises, ansiedade, depressão... Saímos de um mundo que era todo nosso, que conhecíamos bem, para cair de paraquedas na incerteza. Tudo aquilo que nos importava antes, já não parece valer à pena. Habilidades artísticas, pequenas conquistas já não serão lembradas ou valorizadas se isso não servir para ter um trabalho de verdade.

Em um momento tínhamos o mundo em nossas mãos e no outro ele havia escorrido por entre os dedos.

Gastamos nosso tempo em cursinhos, nos matamos dia e noite para chegar a metas que nem são nossas e quando chegamos lá, vemos que não era nada daquilo que esperávamos. Fazer um curso por fazer, não nos deixará felizes, porque é sobre isso que se trata a vida, ser feliz (?).

Explodimos, queremos sair de casa, queremos ser donos de nossas vidas e descobrimos que não sabemos muito sobre o que é viver de verdade. Muitos de nós não sabemos cozinhar, lavar, limpar a casa, fazer o plano de impostos, contas ou até mesmo como respeitar opiniões alheias. E isso é culpa nossa, porque geralmente não demonstramos interesse por fazer coisas de casa, isso até o dia em que moramos sozinhos e entrarmos em desespero com medo do fogão explodir na nossa cara ou alagar a casa com a máquina de lavar.

Crescemos preparados para o mercado e não para a vida, às vezes nem para isso.

E se não bastasse estarmos nessa selva e com nossos próprios conflitos internos, a sociedade nos impões seus padrões de estilo de vida. Aquela vida exemplo: formação em uma faculdade de prestígio, empregos como grandes executivos, casar com a pessoa dos sonhos e ter filhos perfeitos. Tudo isso antes dos trinta e cinco, porque ninguém quer ser um pai sem energia ou correr risco de problemas na gestação por conta de um corpo “velho”.

Pensamos constantemente em nosso futuro e temos a noção de que cada passo que damos agora, nos afetará de alguma forma. Ficamos doentes por preocupações que ainda não tiveram oportunidade de acontecer, passamos a cobrar-nos cada vez mais para sermos melhores. E somos tentados a desistir, viver no piloto automático, o que for mais fácil.

E se ao invés disso, procurássemos pela felicidade? E se tirássemos um tempo para descobrir quem somos e o que gostamos de verdade, experimentar trabalhos em todos os âmbitos, testar, provar, crescer?

Ir contra todas as opiniões e regras é o que nós, Millennials, sabemos fazer de melhor. Aproveitemos essa “qualidade rebelde” para ir contra as pressões da sociedade e buscar aquilo que pode nos fazer felizes, que pode acabar com esse sentimento de “não ser bom o suficiente”. E se for necessário, vamos quebrar a cara. Nossos pais tiveram a oportunidade de mudar e de errar, por que nós não?

Ir contra a corrente não é o caminho mais fácil, ele está cheio de discussões, altos e baixos, mas pelo menos, você saberá que está indo na direção certa ao invés de estar perdido na estrada com neblina que te direcionaram a vida inteira.

O nosso grande problema é que queremos ser mais.

Queremos impactar o mundo, viver a vida, fazer a diferença, mas muitas vezes não sabemos como ou surgem obstáculos em nosso caminho. Nos ensinaram que podemos ter tudo se trabalhássemos para isso, que somos capazes de realizar coisas incríveis se tentarmos.

Em um momento nos sentimos tão grandes, mas esquecemos que esse mundo é o triplo do nosso tamanho e que outras pessoas são o dobro. Por isso precisamos aprender mais para poder crescer, não profissionalmente, mas como pessoa de verdade.

Nós queremos mostrar o que podemos fazer se nos derem uma chance, se nós acreditarmos que somos capazes, se tivermos apoio.

Precisamos testar, provar, errar e fazer coisas estúpidas sem aqueles olhares de desaprovação que nos davam na escola, quando respondíamos algo errado. Temos que entender que não podemos ser bons em tudo, que não somos uma decepção, que não somos um fracasso.

Deixem-nos livres para irmos atrás de nossos sonhos, para errarmos e quebrarmos a cara uma e outra vez. Devemos experimentar mais dessa vida antes de tomarmos decisões importantes.

Só assim seremos capazes de descobrir quem somos e o que queremos de verdade.


Recado de uma Millennial.

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